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Homem-Aranha: O Herói de Todos os Públicos

23 de jul. de 2025

O lado da Terra

[Como essa narração está em primeira pessoa, além do personagem narrar como alguém que está testemunhando essa realidade, também haverá alguns pequenos problemas de vocabulário quando o personagem narrar, como se algumas coisas realmente tivessem se perdido ou palavras novas e termos novos surgissem]

 O ano é desconhecido, estamos a milênios de mais para a humanidade, ainda que sobrevivente, ainda poder lembrar. O céu é cinzento, chove a cada nove dias, mas... assim como fazíamos milênios atrás, as semanas são em sete dias, mas os meses, são 13, é estúpido embaralharmos o calendário só para satisfazer líderes arrogantes de um reino que foi extinto umas três vezes, e por medinho de um número que falavam que dava azar.
 Isso porque eu tive que passar pela Onda pra pegar mais suprimentos, as rações são feitas aqui na Terra ainda, o Setor C-296 é ótimo com as carnes de porco e molho de tomate, dizem que em outro tempo as comidas eram feias de tão ruins e ainda tinham sistema político liderado por reis de enfeite, enquanto boa parte do mundo já votava por seus líderes, e falando nesse passado, que pra você, leitor, é presente, me surpreende ainda termos como lembrar de pequenos pontos da história humana como essa diferença.
 Não posso perder tempo, então pedi por uma ajuda, uma carona de um Catador, o hidracarro que ele usa pra viajar tinha carga pra muitos caixarates que ele usava pra carregar aquelas mercadorias, prometi cuidar delas durante a navegação, mas aquele Catador em específico não parecia já muito feliz, tentei conversar com ele, mas ele me xingou, me xingou com uma palavra que eu não entendi, mas a intensidade dele me assustou. Seguimos por um dia, a chuva parecia bem mais leve que no mês passado, lembro que tinha algumas que só sobrevivi por passar a tempo por dentro de uma das casas, não sei se pra nós dois aqui no hidracarro a sensação era confiança ou alívio.
 O que é um hidracarro? Na frente é como uma carroça, mas há espaço pra até duas pessoas se sentarem com um motorista como aquele Catador, um tipo de agente que coleta tanto frutas quanto caça animais e busca fungos e raízes selvagens, era uma forma comum deles coletarem comida pra Terra, e as caixarates são feitas de madeira de silitra, uma árvore comum nas regiões ártica e subtropical, tão resistente quanto pedras, por isso era confiável pra guardas as comidas além de grãos de matusalina, um sal cultivado nas luas de Júpiter, boa em conservar materiais, o nome é por ser comum pra deixar a gente viver mais, parece que na Terra que a população continua maior o uso medicinal pra velhice é proibido, talvez por controle populacional, mas se for isso não tenho o que fazer em resposta, só aceitar. O chassi é como veículos de combate, mas pelo que eu saiba tem hidrodinâmica e pode boiar, o casco é duro, balístico, mas a maior proteção à frente é a metralhadora automática à esquerda do motorista.
 Pelo menos pude chegar a um vilarejo, mal sabe ele que peguei dois batoides e um betenol, minha marmita irá render mais, e eu saí do hidracarro, o Catador parecia não saber, ou ele só não quis discutir? Bom, aquelas casas cor-de-ouro, talvez mais pálidas e opacas, e um bondinho levando os civis, e vendo o mapa, percebi como tinham símbolos, não eram tão abstratos, eram compreensíveis, mas parece que os pontos eram muito longe um do outro, e pelo visto, eu precisava de uma ficha, eu até poderia conseguir um no ponto mais próximo, mas no caminho, fui assaltado, tentaram me esfaquear, me surpreendo que conseguiram cortar linhas nessa minha roupa de carbonita, mas nenhum sobreviveu a tiros de Kalibri, uma pistola dessas era leve e tem muita munição, mas é muito forte, espero não ter assustado ninguém ao meu redor, consegui três mesmo pedindo só uma.
 De qualquer forma, precisei pegar um bondinho bem rápido ao Leste da cidade, o que leva um total de 1900 microcronos, ou 31 medicronos, um pouco mais de meio macrocrono, espero que meu relógio esteja funcionando devidamente. Naquela vila cor-de-ouro com arquitetura gótica, talvez barroca como vocês chamariam, cada bondinho tinha peças de aço dando firmeza a uma carcaça de madeira com um telhadinho de bronze, os trilhos são feitos de uma liga de oricalco, um metal que ouvi falar que é comum nos Crisáureos, um orbe metálico capaz de transfigurar a matéria, eu adoraria ter um material desse assim como aprendi um pouco o fluxo de energia atômica desse aparelho nas aulas de engenharia.
 Mas chegando ao ponto que eu queria, é só um medicrono de caminhada até um possível Templo, lá era similar a um templo religioso, porém, eu não estive aqui à procura da bênção da Madame Lua, por mais que, por minha família ter sido religiosa, eles pediam pra que eu orasse com eles pra ela a cada nove dias, mas sim por causa da Sala do Leão Verde, uma sala de múltiplos andares, parecia maior por dentro que é visível fora do Templo. Algum controle do vácuo no ambiente pra controlar o tamanho das salas? Não seja idiota, as medidas das salas são obviamente discretas quando os Templos estão perto de outras casas como esse aqui, ou sob montanhas como costuma ser em Marte, apenas arquitetura aproveitando todo esse vácuo entre as salas, e aqui, temos estátuas de leões, alguns com esferas de ouro na mão, outros com elas na boca, um simbolismo antigo, da dominação da realidade física e subjetiva.
 Pude usar a Onda a partir de uma câmara, em troca eu almocei junto com a sacerdotisa que operava naquela sala, e com medo de eu nunca mais a ver, confessei com ela as minhas mentiras, os meus furtos, e daqueles que matei, só aqueles assaltantes dessa vila, e os soldados que tive que abater durante a proteção na trincheira de Novo Volcano, um grande anel de concreto estelar criado pelas Esferas da Criação próximas ao Sol, era uma guerra bem violenta, estava tão chocado de ter sobrevivido que, só de lembrar dos amigos que perdi, eu chorei, e aquela sacerdotisa... me confortou, e antes de eu passar pela Onda pra voltar dessa minha expedição, ela me convidou a um banho de sacra-agualena, um tipo de água energizada com uma força mística lunar, e então, eu pude voltar pra casa.
 No planeta vermelho, Marte, era tudo tão seco e frio quanto na Terra, por incrível que pareça, jovem do passado, uma colônia marciana, ou quem sabe em qualquer ponto atual do Sistema Solar, não está tão utópico quanto numa possível outra história de ficção científica, e assim como não pagamos com moeda, só podemos usar ferramentas e veículos a empréstimos, nossos trabalhos são ganhos com comidas e, quando não há bebidas prontas, também nos pagam com água, ou esses bens são distribuídos por pessoa e por dia em lugares como a fazenda terrestre que visitei, às vezes temos duas opções de banho: o individual, que é permitido 3 medicronos por dia, senão haverá taxações que diminuirão nosso pagamentos ou tempos de uso das ferramentas, como uma enxada ou um machado, até mesmo um sopra-folhas; ou o coletivo, termas públicas foram construídas, e homens e mulheres, de nascença ou transitados, tomavam banho juntos, tive amigos que conheci nessas termas, e muitos relatam histórias de amor que perderam ou nunca tiveram por estão ocupados demais trabalhando, enquanto não puderam conhecer as que sonhavam que fossem suas esposas.
 Não se preocupe com os animais, tivemos fazendas daqueles que há muito tempo já estavam domesticados, animais selvagens eram preservados em pequenos zoológicos, mesmo fora da Terra, lendas dizem que a elite plutoniana tem, além do poder de fabricar os Crisáureos, também grandes dinossauros de estimação, se isso é verdade? Não duvido, já tivemos problemas com uma boiada de brontossauros, ou o meu irmão mais novo relatou ter sido atacado por um therizinossauro numa casa dele em Titã, Saturno. Câmeras nos vigiam, agentes nos avaliam, vindos de Mercúrio, cada agente aparenta nos avaliar minutos antecipadamente e julgar se estamos fazendo o que consideram certo.
 Meu tio Bakiler foi executado por ter falado alto de mais aos patrões depois de ser convidado a uma hora extra, cortado num só golpe na Praça de Eros no planeta que agora estou, e minha tia Sandra e minhas primas foram convidadas a morarem com o Contador da cidade, não sei da situação entre a tia e o Contador, mas elas aparentam dar assistência doméstica e à fazenda sob posse dele, às vezes ela me dá a cada onze dias um prato de fios de massa com cenouras fritas, e me avisa que é uma porção que acaba sobrando. Talvez o Contador, assim como os Silicopescadores, tenha algum domínio e recursos no Novo Volcano, afinal, ele aparenta não precisar retribuído além dos favores de famílias que operem com ele, e o que chamam de casa daquele Contador, é como eram castelos de lendas medievais, só um pouco menor, talvez bem menor, com estátuas do que parecem ser os Observadores.
 Observadores são grandes bípedes de pele de silício, olhos grandes e boca pequena, e embora tenham mãos e pés, preferem usar interferências gravitacionais e magnéticas pra mover objetos, a plebe da Terra chama de telecinese, e eles aparentam ser usados como símbolo de autoridade, como vi em gravuras nas paredes de uma universidade em Vênus, onde estudei com minhas 7 irmãs e minha tia Luisiana para me formar, ao lado de desenhos de pássaros, um símbolo de natureza e sabedoria, mas assim como estampas dos pássaros em Marte e Terra, me observavam.
 Marte, que hoje tem atmosfera densa e campo magnético, tem grandes monolitos que vi por exemplo na Praça de Eros, e que meu pai me contou que era um meio de cortar os ventos antes que formassem algum furacão, talvez assim como no Setor C-195, na América do Norte, e falando no meu pai, minha mãe está desaparecida desde quando eu era pequeno, ela me prometeu uma vez poder voltar, mas nunca mais vi ela, e meu pai era bruto no ensinamento, mas também parecia me censurar, ao menos ele me ensinou a cuidar de ervas e especiarias, e assim eu tinha uma parcela própria de independência, e trocava unidades delas por armamentos, pelo que entendi, quando Fobos faz eclipse no Sol aqui em Marte, é sinal de um mal presságio, e quem sabe minha mãe tanto me falava pra ter uma religião com a Madame Lua, enquanto não era obrigatória a religião, era obrigatório obedecer ao Partido, e quem sabe, a sacerdotisa ter ouvido minhas confissões não sirva como minha advogada, mas como testemunha de ter matado os violadores do que era pra ser a lei.
 Aquele banho com a sacerdotisa segue fresco na minha memória mesmo já estando agora próximo do mês que vem, em vez do dia da minha expedição, e se essa passagem no tempo pareça estranha, talvez vocês não tenham viajado pela Onda, uma ondulação no vazio espacial, arde porque cada molécula é transpassada a outro planeta, o corpo chega em microcronos, o que tem medicronos-luz de distância, mas eu oscilo entre sentir estar no lugar antes de meu corpo, ou sentir um a três macrocronos de viagem, a sacerdotisa me deu um cabeça-dormente, uma mistura de ervas sedativas, pra não sentir dor e nem dissonância psicotemporal.
 Depois da viagem, só precisava de um banho, um banho de 2 medicronos, um um whisky e um bolo de massa de cacau, afinal, é o que resta pra um mero Dracomilitar sem amigos e com a família dividida, ao menos posso durar até o próximo dia?

Fim...